Arquivo mensal: setembro 2014

O que você quer ser quando crescer?

o que você vai ser quando crescerQuando éramos crianças, quantas vezes nos fizeram a pergunta: “O que você quer ser quando crescer?”. O fato é que, ao nascermos, já SOMOS completos. Somos seres perfeitos, feitos à imagem e semelhança de Deus. Os adultos não se dão conta de que é na infância, enquanto estamos ainda na fase da inocência, da mais singela pureza, que estamos mais próximos de nosso espírito. As crianças já nascem perfeitas e estão em harmonia com o Universo no momento em que chegam ao mundo material.

Se pararmos para pensar, nossa pergunta sobre o que a criança pretende ser ao crescer está baseada na crença da escassez, à qual estamos tão enraizados. Ou seja, ela embute o pensamento de que somos incompletos, e que ainda temos um longo caminho pela frente para conseguirmos “ser alguém” no futuro, quando, na verdade, temos tudo o que precisamos para sermos completos agora!

Fomos todos educados e criados por adultos. Adultos que, ao longo de sua jornada, perderam sua espontaneidade, inocência e pureza que lhe eram tão naturais. Aos poucos, conforme vamos construindo nosso ego através do contato com o mundo externo, começamos a perder essa espontaneidade para nos tornarmos adultos racionais. Deixamos de ouvir nosso coração, e passamos a dar total atenção à nossa mente.

E, considerando que a criança está mais próxima do Criador, gostaríamos de trazer a reflexão do que é ser criança.

A pergunta tão banalizada, e talvez à qual damos pouco significado, carrega consigo as lentes pelas quais a maioria de nós enxerga o mundo. Entender o significado de ser criança pode nos fornecer elementos para que consigamos viver de forma mais plena e com leveza. E, se temos que esperar crescer para sermos alguém, isto significa que estaremos sempre esperando um tempo futuro, onde nossos sonhos se realizarão? E o que estamos fazendo com o momento presente que nos é dado?

Vocês já notaram como as crianças vivem intensamente o momento presente? E o que é viver o momento presente? Todos nós nos recordamos daquelas famosas palavrinhas de criança: “de novo, de novo!”. Sabem por que não conseguimos compreender a alegria que as crianças sentem ao ouvir as mesmas histórias ou fazer a mesma brincadeira repetidas vezes? Porque vivemos os momentos da nossa vida baseados na experiência passada ou na expectativa de um momento futuro. Você já observou como uma criança brinca repetidas vezes da mesma coisa e encontra alegria em cada uma delas? Ela entra no mar e pula cada onda como se fosse a primeira. A criança olha para o mar, sente seu cheiro, ouve seu tão conhecido barulho, sente a água em seu corpo, pula e se diverte a cada onda como se aquela fosse a única vez em que ela havia feito aquilo. Se pararmos para pensar, essa realmente é a única vez que ela pula aquela onda, naquele dia, com aquela temperatura, sob o olhar cuidadoso de sua mãe. Cada momento de nossa vida é único e singular. Nós, adultos, costumamos viver os momentos de nossas vidas de forma relativa: “Não foi tão legal como aquela outra onda.” Nosso momento presente é carregado de sentimentos passados sobre aquela situação, ou de expectativas sobre o que esperamos desse momento em relação aos parecidos que já vivemos. Com isso, perdemos a pureza de viver o momento presente simplesmente como ele é, de forma absoluta e pura.

Assim, ocorre que o adulto entra no mar e imediatamente traz à memória todas as outras vezes em que esteve nele. Não se permite sentir o mar, pois acha que já o conhece. Ou mesmo, enquanto a onda envolve o seu corpo, este já avista a próxima maior e melhor que está por vir. E não percebe que, de maneira triste, ele deixa de vivenciar tudo o que aquele exato momento oferecia para ele. E, quantas vezes, sem compreender que cada momento é único e deve ser plenamente vivido, tolhemos a criança que se diverte? Nos gabamos por sermos multifuncionais, mas será que cada coisa que fazemos não merece atenção e cuidado exclusivos?

Quando recriminamos uma criança que se diverte, estamos, na verdade, recriminando nós mesmos. Temos medo de acolher e vivenciar tudo de bom que nossa criança oferece e não nos julgamos dignos de tê-la dentro de nós. Quantas vezes observamos nossos filhos e já eliminamos a possibilidade de cultivar a espontaneidade deles porque pensamos: “isso é coisa de criança!”. Realmente, faz parte do ser criança. Porém, o que não compreendemos é que também merecemos viver a nossa criança, aquela que está dentro da gente, e receber tudo que ela tem para nos oferecer. No entanto, nos julgamos incapazes de cuidar dela e, por isso, a renegamos. Não aceitamos que também podemos ter acesso a toda essa pureza, pois achamos que isso não faz parte do mundo dos adultos.

O fato, portanto, é que existe uma criança dentro de cada um de nós, mas é necessário nutri-la, é necessário tomar conta dela. Essa criança é a nossa verdadeira essência, ela nos devolve a nossa mente pura, a mente que compreende que tudo o que buscamos é algo que já temos em nós mesmos. Buscamos apenas aquilo que já conhecemos. Não nos contentamos com menos, pois, de alguma maneira, ainda guardamos uma lembrança, um vislumbre de tudo o que, de fato, somos.

E quando deixamos de ser criança? Entendemos que deixamos de ser criança a partir do momento em que começamos a colecionar mais memórias e sentimentos ruins do que bons. É como se andássemos com dois compartimentos: aquele que guarda os momentos que nos são gratos, que nos fazem voltar ao que realmente somos; e aquele que guarda as mágoas, que guarda tudo aquilo cuja lembrança nos faz sofrer. O primeiro é real, nos devolve as partículas do nosso verdadeiro ser e vai nos ajudar a reconstruir a nossa verdadeira essência. O segundo é uma ilusão, que carregamos e suportamos sem nos dar conta de que esse compartimento deveria ser esvaziado todos os dias. Por um acaso, conscientemente, guardamos lixo em nossa casa? Nos livramos dele sempre que possível, não é mesmo? Por que então guardamos lixo no maior presente que recebemos: nossa própria vida? Por que damos tanto peso a esses sentimentos que nos distanciam do nosso verdadeiro ser?

Se todos temos uma criança dentro de nós mesmos, como fazer para que ela permaneça feliz e nutrida? Como fazer para que ela entenda que ela é a única razão de estarmos todos aqui? Como fazer para que ela não seja soterrada por todas as mágoas que tão insistentemente teimamos em guardar?

E qual seria nossa missão perante as crianças com as quais convivemos, principalmente com os nossos filhos? Devemos fazer com que elas se tornem adultas capazes de acolher e nutrir sua própria criança. Que elas sejam leves e conscientes ao armazenar as lembranças e os ensinamentos que recebem todos os dias, a todo momento. Tudo o que vivemos sempre nos traz uma lição, e a lição é sempre de amor, sempre nos recordando de que nossa essência é pura, que nossa única missão é ser feliz e sentir a vida como a criança que um dia fomos. É claro que ser adulto é assumir muitas responsabilidades, mas não precisamos fazer com que isso seja pesado, e que nos distancie da nossa pureza, pois isso faz nossa criança adormecer.

Nesse momento, sugerimos que cada um de vocês pense, com sinceridade, se somos um lugar agradável e aconchegante para acolher a criança que tenta sobreviver em cada um de nós. Estamos dando nosso melhor para que nossa criança esteja acordada e feliz? E, se ainda não somos assim, sugerimos que, ao final de cada dia, façamos um balanço de tudo o que armazenamos dentro de nós mesmos e que descartemos as mágoas e armazenemos gratidão e amor.
Juliana Kurokawa